quinta-feira, 7 de maio de 2015

Escambo, Ganância e Indústria Automobilística


Faz algum tempo, e cada vez mais alto, se escutam notícias como as que seguem na mídia nacional:
  • Em São Paulo, Volks põe 8 mil metalúrgicos em férias coletivas;
  • A General Motors (GM) também mantem 819 metalúrgicos em lay-off na fábrica de São Caetano do Sul (SP) desde novembro do ano passado. E ainda mais 473 metalúrgicos com contratos suspensos na unidade de São José dos Campos (SP), desde março até agosto;
  • Na Mercedes-Benz, são 850 trabalhadores afastados ao todo. A Mercedes tem ainda 100 metalúrgicos em lay-off até o fim de maio na fábrica de Juiz de Fora (MG);
  • A Ford, por usa vez tem 424 metalúrgicos em banco de horas desde 23 de fevereiro, por tempo indeterminado, em São Bernardo do Campo (SP). No fim de março, a montadora demitiu 137 funcionários da unidade Taubaté, após oito meses de lay-off;
  • Na fábrica da Volvo em Curitiba (PR), 1,5 mil trabalhadores estão em bancos de horas desde o dia 24 de abril para adequar a produção à demanda. De acordo com a companhia, eles devem retornar ao trabalho na quarta-feira (6);
  • Na fábrica de caminhões MAN Latin America em Resende (RJ), a carga horária está reduzida em 10% desde dezembro;
  • Nas duas fábricas da Marcopolo em Caxias do Sul (RS), acordo entre sindicato e empresa prevê até seis dias de parada de produção por mês, entre abril e maio;
  • Com a produção de veículos em queda, a Pirelli vai colocar em lay-off por cinco meses, a partir das primeiras semanas de maio, 1,5 mil trabalhadores das quatro fábricas que possui pelo País. Tal número equivale a 12,5% de toda a mão de obra da fabricante de pneus.
Acompanhe-me.
Vamos, por um átimo, fingir que os únicos problemas que assolam o País sejam os expostos acima. Então teriamos uma conta que, por alto nos dá algo em torno de 13,803 trabalhadores em regime de lay-off ou que foram demitidos da segunda metade do ano passado até hoje. E isso, somente nas maiores empresas da indústria automobilística. Os dados das empresas de insumos menores ainda não tenho, e provavelmente, não teremos nunca.


Como já mencionei antes, em outro post deste mesmo blog (Mão Pesada), a indústria automobilística brasileira tem sido beneficiada, e muito, por isenções e descontos de taxas e impostos, várias vezes no decorrer dos últimos anos, com a justificativa de evitar demissões e crises sócio-econômicas que desestabilizariam as instituições democráticas, a sociedade e o "american way of life".
Seria "o diabo a quatro", em outras palavras.

Mais uma chantagem sem-vergonha, onde o trabalhador, na contenda, volta a ser tratado como moeda de troca entre as famosas "forças ocultas". Chantagem sim! Perceba como o automóvel NÃO É artigo de primeira necessidade, ou essencial. Algo como a cultura do tabaco, por exemplo. No entanto, transformamos (virgula, que não fui eu/nós!) a indústria automobilística quase que em monocultura brasileira.


E, como sofremos de uma miopía endêmica, não percebemos a produção (nem quase nada, diga-se de passagem) de forma holística. Achamos que produzir -qualquer coisa- se reduz somente a isso; produzir. Não vemos as intrincadas redes e relações que qualquer (repita comigo: Q-U-A-L-Q-U-E-R) produto ou serviço tece ao seu redor.
Por um lado, em nome dum progresso industrial rápido e virtual, desde os anos 50, o governo investe pesado na indústria automobilística e na sua infraestrutura.
Oba, o Brasil é o 7º maior produtor de carros no mundo!


Vamos por partes; nós não criamos nada.
Temos algumas montadoras de marcas estrangeiras e muitas fábricas menores, fornecedoras de peças para essas montadoras. Entretanto o "carro brasileiro", que por lei, deve ter em torno de 70% de peças fabricadas no Brasil, continua a ser um dos mais caros, e tecnologicamente mais defasados, do mundo.


Ano 2015/Modelo 2016
Segundo reportagem publicada recentemente num semanário local, "Os preços exorbitantes são decorrência de um conjunto de fatores: carga tributária excessiva, gastos elevados com matéria-prima, mão de obra e logística, falta de competitividade, margem de lucro maior do que no exterior, demanda crescente e consumidores dispostos a pagar mais". Ufa, isso desestimularia qualquer um.

Epa, como assim: "consumidores dispostos a pagar mais"?
Eis um dos paradoxos da cultura do "levar vantagem em tudo". Dificilmente haverá uma relação ganha-ganha, nem mesmo um empate empático e gentil.



E, por outro lado, as vantagens concedidas repetidamente, criaram uma bolha que agora está prestes a -como todas as outras bolhas antes dela- explodir na nossa cara. Vejamos, se o governo reduz temporariamente o recolhimento de imposto, digamos o IPI em 7 pontos percentuais, é lógico que aumentará o consumo. Mas, um consumo artificial, temporário enquanto o governo manter essa renúncia fiscal.

As empresas, por seu lado, ao invés de buscar, e propor, soluções proativas para fazer verdadeiramente frente a estes custos e situações, estará muito contente ocupada produzindo e antecipando as vendas a curto prazo. O longo prazo delas é amanhã.

Lembra das aulas básicas de gestão e psicologia comportamental? Diziamos que: "O homem é um sistema aberto, resultado da somatória de (1) sua bagagem hereditária, (2) dos acontecimentos da sua história particular e (3) do meio-ambiente em que vive".
Será então muito fácil explicar porque ele (o homem) ao lembrar (1) o que lhe aconteceu (2) poderá evitar que aconteça de novo (3).
Certo?

No caso das montadoras, errado... Primeiro saturam antecipadamente o mercado e depois, como crianças malcriadas irão fazer birras, jogar a culpa nos outros (entenda-se: no governo, seja lá qual for) e quem vai pagar a conta serão os (des)empregados, e você... e eu.

Dizer que as montadoras estrangeiras poderiam sobreviver sem esses incentivos, mas que a maioria das menores nacionais não, me parece uma temeridade. Monte um carro sem parafusos de roda ou amortecedores, por exemplo. Mesmo a disposição do consumidor de pagar mais seria grandemente arrefecida. As margens de lucro diminuiriam consideravelmente, fechariam-se as portas da burra estatal.
Não seriamos mais o 7º maior produtor de carros do mundo, eu sei.

...
Uma pena.



“A não mobilidade é o caminho natural das metrópoles que optaram por sistemas de transporte sem planejamento ou por políticas que privilegiam o transporte motorizado individual e não investem em redes estruturadoras de transporte público”, afirmou Manoel da Silva Ferreira Filho, presidente da Associação dos Engenheiros e Arquitetos do Metrô (AESMESP).


_____________________________________

Posts relacionados:

Mobilidade Urbana
Sistemas
Mão Pesada
Consumo como afirmação
Redes
(Geopolítica e Logística no Brasil)

Nenhum comentário:

Postar um comentário