quinta-feira, 28 de agosto de 2014

A Garantia Soy Yo

O que acontece quando você passa a ser seu próprio produto?
Ou então, quando seu produto é você mesmo... e o sotaque já vem incluído!
Convencer os outros que você pode ajudá-los a desempenhar melhor o serviço que eles já fazem cotidianamente, ou até inventaram, é tarefa inglória. O advogado do diabo terá que estar convencido, e até mais do que você, do seu plano simples ser funcional. Empiricamente falando.
Tenho um plano. É mais uma visão, se preferirem...

Tenho visto muitos consultores de negócios, enfurnados em Armanis e Versaces, como um bando de periquitos gritando por algumas empresas em que colaborei, sempre fazendo perguntas sobre processos e fluxos e desenvolvimentos e distribuindo algumas KPIs. Mas não me lembro de se interessarem pelas pessoas que executavam os tais processos, alinhavavam os fluxos e verificavam desenvolvimentos com vistas aos tais kpis. Eram dispensáveis, invisíveis... peças de reposição. Limpavam, desengraxavam e reembalavam os processos, fluxos, desenvolvimento e KPIs.
Os adicionavam aos seus currículos e esqueciam.
Faziam uma apresentação em Power-sei-lá-o-quê, eram aplaudidos de pé pela diretoria ensandecida, música e efeitos de luz, recebiam e iam embora.

Acho que não gosto de consultores.

Pena, por conta de circunstancias, me tornei um deles. Tentarei não mostrar aborrecimento quando as perguntas começam a aparecer na minha mente. Vejo a roda girar mas, esse hamster está bem morto. Faz tempo...

Minha mãe falava que corriamos muito para chegar a lugar nenhum. Eu sempre achava graça da simplificação. Agora entendo, e não acho mais engraçado.


Morloks de terno e gravata de seda. O único lugar, fora a política, onde a ignorância é ferramenta de trabalho.


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segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Mobilidade urbana

Dia D, ao começo do fim da Segunda Guerra Mundial, em 06 de junho de 1944, foram transportados um pouco mais de 156 mil soldados em um único dia. Uma proeza que até hoje, setenta e tantos anos após, é cantada e celebrada em verso e prosa. De lá para cá vimos e ouvimos uma miríade de informação sobre o feito logístico que foi alcançado. Pouco importavam o número de mortos e feridos na primeira hora ou a destruição que a guerra impôs.


A dança milimétrica das peças sobre o tabuleiro, os transportes girando para obter sincronia perfeita e fazer ondas de assalto geograficamente planejadas, obtendo saturação. Vencer o inimigo pelo volume numérico da oponência. O cálculo da maré e dos ventos, o horário certo, e uma tonelada e meia de informações multidisciplinares prévias ao evento, todas analisadas em unissono.
Nada deixado ao "acaso", sem fios soltos. Sabiam como funcionava e porque.



Não somente ideias e ideais em campos opostos, modos de vida estavam em jogo. A psique de ambos os lados posta na balança. Quem estava, e quem não foi lá participou de uma forma ou outra da batalha que ecoa até os dias de hoje. 156 mil soldados e seus equipamentos, um dia pleno de processos de logística. G2, G3 e G4.
"Mas, quem conta a história são os vencedores..."


Setenta e tantos anos mais tarde, no Brasil, país em desenvolvimento, está às voltas com um inimigo muito mais insidioso: a gestão imprevidente e diletante.
Bem no meio de uma federação criada nos moldes da americana, existe um sistema de transporte urbano multimodal capaz de deslocar um contingente parecido com aquele.


O município de São Paulo, capital do estado do mesmo nome, possui o 10º maior PIB do mundo, (15) representando, isoladamente, 11,5% de todo o PIB brasileiro 10 e 36% de toda a produção de bens e serviços do estado de São Paulo, sendo sede de 63% das multinacionais estabelecidas no Brasil, (16) além de ter sido responsável por 28% de toda a produção científica nacional em 2005.(17) A cidade também é a sede da Bolsa de Valores, Mercadorias e Futuros de São Paulo (BM&F Bovespa), a segunda maior bolsa de valores do mundo em valor de mercado.(18) São Paulo também concentra muitos dos edifícios mais altos do Brasil, como os edifícios Mirante do Vale, Itália, Altino Arantes, a Torre Norte, entre outros.


São Paulo é a sétima cidade mais populosa do planeta e sua região metropolitana, com cerca de 20 milhões de habitantes (19) é a oitava maior aglomeração urbana do mundo.(20) Regiões ao redor da Grande São Paulo também são metrópoles, como Campinas, Baixada Santista e Vale do Paraíba; além de outras cidades próximas, que compreendem aglomerações urbanas em processo de conurbação, como Sorocaba e Jundiaí. Esse complexo de metrópoles — o chamado Complexo Metropolitano Expandido — ultrapassa 30 milhões de habitantes (cerca de 75% da população do estado) e forma a primeira megalópole do hemisfério sul.(21)

Todo dia as engrenagens do município giram seguindo os mesmos padrões. Seus sistemas têm picos de atividade repetitiva, Funcionamento-manutenção-funcionamento, uma e outra vez a repetir.


Somente o sistema de transporte urbano, por exemplo, funciona repetindo o mesmo desempenho diário:
  • os trens transportam 1,1 milhões de pessoas;
  • o metrô transporta 4,5 milhões de pessoas e
  • os ônibus transportam 9,9 milhões,
em media diariamente. Somando esses valores todos dão: 15,5 milhões de pessoas, em média. 7.75 milhões para ir e 7.75 milhões para voltar. Diariamente.
Ainda estou/estamos esperando para ver os cantares, em verso e prosa, deste feito de logística.

O que vemos é um total detachment entre processo e (sujeito) processado. Muito provavelmente por ignorância dos números elevados de uso, ou da importância do processo logístico em si. Ou ainda pior, pela ignorância da complementaridade de ambos. Como se o passageiro não participasse do processo de transporte, não pertencesse, ele próprio, à cidade, ao município, em que vive e trabalha. Não percebe a ligação estreita entre si e o ambiente que o rodeia.
Pólis [(Grego: πόλις), plural poleis (πόλεις)] é um conceito muito vago e complexo para ele entender. Ainda mais para aceitar que seja parte constituinte de si mesmo.


A ideia geral é, resumindo, que: assumem, a cidade e o seus habitantes como dois indivíduos diferentes e completamente independentes um do outro. Este conceito ninguém discute. "Só sei que foi assim" - disse Chicó.

Isto explicaria, então, porque quando há "manifestações populares ou públicas", os exemplos mais evidentes do "Poder Público" sejam justamente os transportes urbanos. E, sejam eles, os que primeiro sofram a sanha ensandecida da massa. Queimam-se ônibus, quebram-se composições de trens ou depredam-se estações de metrô. Agentes econômicos vêm logo a seguir. Interrupções ao trânsito e depredações da propriedade privada, nem sempre ligadas aos poderes públicos, acompanham a "expressão de descontentamento popular".

Todos sabem que o sistema não funciona, só não têm a menor ideia de como é mesmo que ele funciona. E, igual ao vôo das abelhas, o sistema continua funcionando sem alarde. Nem político, nem historiador, ou apesar deles todos. Poucos poetas e alguns cineastas ainda se assomaram timidamente ante o espetáculo do processo em curso. O próprio governo não se apercebeu do volume que tem em mãos.
O povo o assume como natural, um seu direito. Como quando os antigos reis anunciavam seus "direitos divinos" de governar.



O crescimento da cidade exige do sistema de transportes adequações diárias de extensão e tempos. Não sendo proativo, o sistema segue, a duras penas, o desenvolvimento da metrópole. A substituição do transporte privado pelo transporte coletivo exigiria muito em termos de custo e movimentação.
E a cidade e seus habitantes, só repetem as palavras do Gen. Dwight D. Eisenhower no Dia D: "Não aceitaremos nada menos que a vitória total".





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Referências:

Dia D
15
10
16
17
18
19
20
21
SPTrans

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terça-feira, 12 de agosto de 2014

Campos floridos

[No LinkedIn apareceu um post que dizia  Além da tenda: Por que campos de refugiados precisam de arquitetos (agora mais do que nunca) Comecei a escrever um comentário e, quando dei por mim, este texto estava quase pronto.]

Sempre achei que os campos de refugiados seguissem a mesma "disposição" que os campos, tipo bivouacs, militares; são temporários.

Refugiados islámicos na 1ª Guerra dos Balcãs

O que vemos hoje em dia é uma (des)temporalização dos campos e o aumento de seu "consumo" (como em densidade populacional) com as agravantes inerentes a esse adensamento.

Assume-se "refugio" como situação passageira, não como o tônus regional e caos em que se convertem. Esses deslocamentos populacionais 'en masse' só acontecem em tempos de crise (natural ou política) e vão somente até a periferia do distúrbio. Dificilmente se afastam muito do local, criando bolsões, os tais campos de refugiados.

Os problemas de adensamento populacional (no Líbano, cuja população é de 4,4 milhões, já há mais de 1 milhão de refugiados sírios, por exemplo) ficam rapidamente evidentes nestas condições. Os primeiros a aparecer são sempre a violência contra as mulheres ou contra os mais fracos.

Manuais e teorias servem como base para a ativação emergencial destes campos, mas não passam disso: bases para ativação. O dia-a-dia e a diminuição do estresse dessa população não constam desses manuais. Isso passa por outro tipo de intervenção que é bem capaz de criar um novo tipo de distúrbio.

Melhorar as condições arquitetônicas desses campos, a médio e longo prazo, não iria melhorar a situação geral. O que era para ser temporário, torna-se fixo. E, era do "fixo" anterior que se fugia. Este novo "fixo" trás consigo seus próprios problemas.

Refugiados belgas na França, 1914-15

Siga meu raciocínio; se as pessoas fogem do "fixo" para o "temporário" que, com o tempo se transforma em novo "fixo". De onde as pessoas hão de fugir, pelas mesmas razões que fugiram do primeiro lugar. E assim por diante. Logo (silogísmo besta, eu sei) o problema não é, de forma alguma, o local... "fixo".
O problema são as pessoas que o habitam.
Somos nós... gente.

Refugiados Palestinos

Os refugiados SÃO uma parte importante do problema. Eles não pedem para estar alí, eu sei.
Não podemos, nem devemos, penalizá-los mais ainda. Todos com certeza quereriam estar em suas casas! É lógico que como em todo ajuntamento humano se aglomeram alí, boas e más, pessoas.
E, para encurtar a história, acabam transferindo o problema para outros locais. Não é culpa deles.
Ninguém chega uma bela manhã, abre as janelas e sorrindo diz: "olha quem veio almoçar conosco! A Guerra, a Fome, a Peste e a Morte! Oy vey! (אױ װײ)"
Inocentes todos...

Veja, há uma dicotomia explícita em todas as áreas de conflito.
Há, de um lado, os beligerantes, armados até os dentes e prontos para matar pelos motivos que forem, nem precisam ser os "motivos certos". E do outro, os refugiados, em desabalada fuga. Nem sempre para o lado certo, mas nessas horas o importante mesmo É correr!

Muitos fogem apenas com uma trouxa de roupas e outros nem isso! Largam tudo o mais e vão arrastando com eles, seus filhos e velhos. Não há código de vestimenta na hora de sair correndo.

Refugiados Coreanos, 1951

Não estão ali para aproveitar de nada. Quando chegam aos campos de refugiados, lhes é oferecida comida quente e uma tenda, se tanto. Não consigo me livrar das imagens da 2ª Guerra e de outras menos populares ou cinematográficas. Filas enormes de gente levando trouxas às costas e um olhar de desespero, esvaziado de humanidade.

Posso parecer insensível, mas longe de mim, sinto o desamparo e me solidarizo com cada um deles. Não deixo, por esse mesmo motivo, de ver o que fazem uns com os outros. "Homem lobo do homem" disse Hesse (o Hermann, não o Rudolf) uma vez, não foi?

Refugiados Vietnamitas

Generalização!
Será que estou a cometer isso? Como vés, sou um porco-espinho.
Lamento é, eu mesmo não ver a solução, por isso parece uma generalização. Mas, é essa mesma generalização que é utilizada por manuais de ajuda e teorias benfeitoras de organizações internacionais, e ninguém reclama disso!

Por isso não coloquei no meu comentário o tão procurado: "Eis a solução" (ir-ia colocar: "Euréka", mas achei pedante sair pelado correndo no meio da rua, fazendo escândalo e alvoroçando os cães). Mas, o quadro que ninguém quer ver passa invariavelmente por ai.
A distância, e a internet, adoçam quase tudo.

Refugiados Vietnamitas

Generalização não resolve.
Ou, resolve tanto quanto campos de refugiados...
Campos de flores (onde para nascer precisam ser enterrados).


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sábado, 9 de agosto de 2014

GuestArte 5: Igrejas #2

Ainda estive revisando meus guardados em CDs, DVDs, floppys (sim, ainda tenho um monte desses) e encontro mais fotos. Desta vez foram feitas com uma velha Samsung Digimax 300 (3MP).
O temas continuam os mesmos; todo o que consiga fotografar tirando a máquina do bolso da calça, antes do momento se esvair.
Espero que como as anteriores, continuem gostando do que lhes apresento.







Esta é uma série feita na basílica de Aparecida.



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quarta-feira, 6 de agosto de 2014

Frutas e Legumes Feios

É assim...
Na França, em Provins, uma cidade medieval no centro do país,  esta empresa de supermercados, ou deveria usar o termo logístico, varejistas urbanos, percebeu que havia uma enorme quantidade de produtos, horti-granjeiros principalmente, que iam diretamente do produtor para o lixo. Por ano, por volta de umas 300 mil toneladas.
Independente, e apesar de, estar bons para consumo humano.


O Intermarché Provins (Seine-et-Marne) ofereceu frutas e legumes abaixo dos padrões a preços 30% mais baratos aos seus clientes como opção de compra, bem ao lado de frutas e legumes "normais". A agência de publicidade Marcel, foi a encarregada de acompanhar e apoiar a operação com uma campanha de publicidade na cidade. Criou-se o nome e um universo ao redor da operação chamada simplesmente de: "Frutas e Legumes Feios" (Fruits-et-Légumes-Moches).

O sucesso foi imediato. A revista LSA, especializada em varejo chegou a comentar que o evento tornou-se a história mais lida no seu portal. Com um investimento baixo, somente alguns milhares de Euros para compra do espaço, aproveitou-se aquela produção que seria, de outra forma, descartada ao lixo.
Uma campanha de cunho ecológico... ou, na verdade, até que enfim alguém pensou com a cabeça.

Apesar da empresa Intermarché ter uma série de outros problemas, como muitas outras empresas, ela resolveu replicar a campanha por toda sua rede de supermercados.

Assista a chamada da campanha a seguir:


Enquanto isso, em Pindorama...

Produzimos 190 mil toneladas de lixo por dia. 13% são jogados nas ruas, 87% é coletado pelos serviços de limpeza urbana. Deste lixo, 51,4% são resíduos orgânicos, 16,7% são outros resíduos e 28,9% são embalagens variadas. Destas embalagens 34,7% vão parar no lixão e 65,3% voltam por reciclagem às fábricas. Segundo a Pesquisa Nacional de Saneamento Básico em 2008, Brasil produziu 58,5 mil toneladas de resíduos sólidos urbanos recicláveis, por dia!


É lógico que você sabe que o Brasil exporta tecnologia e processos de reciclagem. E somos, em várias instâncias, um dos primeiros países a aplicar a reciclagem com constância e métodos. Recentemente, em 02 de agosto de 2010, o governo lançou uma lei sobre resíduos sólidos urbanos (RSU), a Lei 12.305.

Segundo dados do Datamark/Brasil Food Trends 2020, em 2011 os maiores consumidores de embalagens do mundo (Estados Unidos, China, Japão, Alemanha e França) gastaram US$ 361 bilhões. As projeções para 2016 indicam que esse gasto será de US$ 439,6 bilhões. No Brasil, nessas mesmas datas gastamos, US$25 bilhões e  gastaremos US$ 30, 8 bilhões em 2016.


Mas, nem tudo está perdido ainda. O Brasil é considerado referência internacional em logística reversa e recolhimento de embalagens vazias. Ocupamos o posto de país que mais recolhe embalagens de agrotóxicos vazias, com 94% coletados em 2013. No mesmo período a França recolheu 77%, a Alemanha 67%, Japão 50% e os Estados Unidos somente 33%, em média. Mas isso é somente um exemplo, fazemos muito mais.
E ainda é pouco.

Aqui, me atrevo a inserir um aparte, onde recomendo a leitura do artigo de José Mendonça de Barros, escrito ainda em 2012, no Canal do Produtor, para melhor análise da produção agrícola brasileira: Brasil e a Agricultura Mundial.

Por que de tudo este post?

Apesar de parecer disperso e incompleto -nenhum post com este tema estará completo- ele mostra a urgência de atitudes e o simples e barato das soluções possíveis. E sou prova disso. Tenho um pequeno sítio ao pé da Serra da Cantareira, uma pequena criação de galinhas, porcos e uma vaquinha mini-Jersey. Todo sábado vou à feira livre e recolho o descarte de frutas e legumes. Consigo encher com uma parte deste volume a caçamba da caminhonete*. E levar para suplementar a alimentação dos animais. Antes disso passo num supermercado e recolho as caixas de verduras que são descartadas das gôndolas ou na inspeção de entrada.

O que não deixa de me surpreender é a quantidade de alimentos ainda em condições próprias para consumo que é descartado toda semana. A cada dia. E quando cheguei a sugerir que fosse aproveitado (criando assim um novo produto e serviço ofertado aos clientes) de alguma forma, me tornei alvo de zombarias.
Sou visto como um excêntrico, pouco mais que um doido, que tem por hobby coletar frutas e verduras descartadas do supermercado.




* L200. Tive que desenhar grades laterais para poder aumentar o volume carregado. Além da economia no custo da ração, os animais adoram, a vaca é viciada em maça.


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